Friday 22 November 2013

Cheguei mãe!


Chegar em Londres foi relativamente fácil, mas de cara já apareceram os primeiros problemas. Eu e o Rafael tínhamos pago uma “agência” que, segundo a promessa, iria nos buscar no aeroporto, levar até a residência, que foi alugada através dessa mesma agência, levar comprar celular, ajudar a abrir conta em banco, além de outras coisas. Mas adivinha?! Nem sinal do pessoal da tal agência.
O Rafael, que já tinha tido uma adorável surpresa quando chegou, e já estava de saco cheio da tal agência, resolveu ligar e cobrar pelo menos o taxista.
Depois de uma hora e várias ligações, eis que chega um taxista enorme e assustador com meu sobrenome escrito errado na plaquinha – Toris – só pra variar meu sobrenome escrito errado!
É um sobrenome tão simples, não entendo como as pessoas conseguem errar tanto! (Enfim...)
 
Além de assustador, o sotaque do sujeito era incompreensível, uma mistura de Inglês Britânico com Africano (provavelmente Nigeriano).
Com um pouco de receio e sem entender nada do que o taxista dizia, o seguimos até o carro.
Fui direto do lado direito do carro, e o motorista me perguntou se eu queria dirigir. Pronto! A primeira, de várias gafes cometidas por causa da mão inglesa e dos benditos carros ingleses.

Na ida do Heathrow pra minha nova casa em Bermondsey, a coisa que mais me chamou atenção foram os carros sendo dirigidos por fantasmas, pois é isso que parece pra quem esta acostumada com a direção do outro lado do carro. O fato de estarmos do outro lado da rua não me impressionou muito, mas os carros sendo dirigidos por motoristas sentados no lado do passageiro, é algo muito bizarro pra quem acabou de chegar.


Moreton House - Bermondsey
O lugar onde passei a chamar de casa era um condomínio de prédios antigos ao lado do Southwark Park, que é um parque bem bonitinho!
O apartamento onde morávamos tinha 3 “quartos” e era dividido por 6 pessoas. Um casal - uma Colombiana e um Brasileiro em um quarto, no outro uma Boliviana e no terceiro quarto, que na verdade era a sala, mas que foi transformado em “quarto”, eu, o Rafael e o Fabricio (um amigo nosso também de Pato Branco).
Chegamos em casa e o Rafael rindo já foi dizendo pro Fabricio: "chegou o banco"! Como eu estava trazendo dinheiro, e o Rafa não tinha conseguido muitos trabalhos, eu acabei virando "o banco"! E foi por isso que o primeiro lugar que fomos "passear" foi o mercado.

Mal chegamos e já fomos pro metrô – Tube – pra irmos ao famoso Tesco, chamado pelo Rafael e Fabricio de “segunda mãe”.

Mal cheguei e os meninos me levaram pra comprar meu primeiro passe pra semana, aprendi depois, que a vida tem um ritmo diferente em Londres pra quem tem trabalho temporário como os nossos. Se compra o passe semanal por que o pagamento de salario é semanal.

 
O Underground é um mundo à parte, com suas cores e cheiros, nomes esquisitos de estações, que se tornam mais esquisitos ainda se você decide traduzí-los. A estação de Bermondsey, há uma quadra da minha mais nova casa, fica na Jubilee Line, a mais moderna das linhas de metrô e também a mais bonita. Não que as outras linhas sejam feias, cada uma tem o seu charme, mas a Jubilee é minha preferida.
 
Quando você olha o mapa do metrô, todas aquelas linhas entrelaçadas parecendo um rabisco de criança, tudo parece muito complicado. Quando o Rafael me deu um daqueles mapinhas de bolso e disse com aquele jeito delicado de irmão :“presta atenção nas linhas e tal”, "presta atenção nas cores" e começou a me explicar como funcionava, tive a impressão que ele estava falando grego, ou inglês, o que naquela altura do campeonato parecia tudo a mesma coisa.
 
Tinha acabado de chegar de uma viagem absurdamente longa, tinha enfrentado a imigração, me assustado com o taxista e os carros sendo dirigidos por fantasmas, sendo apresentada a minha nova casa, sendo chamada de banco e de repente, me vi dentro do metrô, tendo que entender como usar aquela joça. Entendi mais ou menos, mas como o Rafael ficava repetindo “é fácil” “é tranquilo” eu não me preocupei muito, o teste veio quando eu tive que pegar o bicho sozinha.

Minha primeira aventura no metro sozinha foi no dia seguinte, sem celular ainda e com meu ticket pra semana fui toda confiante pra estação de Bermondsey. Peguei a Jubilee Line com direção ao centro, queria ver a Tower Bridge, mas passei a estação e fui parar do outro lado do Tâmisa sem perceber. Como não percebi? Não sei e não me pergunte!

Andei, Andei e percebi que estava perdida, e como não tinha me tocado que atravesara o Tâmisa, pedi as informações erradas e acabei ainda mais perdida. 
Sem celular, numa cidade grande onde eu conhecia no máximo 5 pessoas mas tinha o contato só de 2, comecei a ficar realmente preocupada.
 
- “Ninguém mandou não prestar atenção nas explicações do Rafa” eu pensava e me torturava. Entao pedi informação pra 2 meninos, pra tentar entender onde eu estava. E um deles, sem pensar duas vezes, me deu o celular pra que eu pudesse ligar pro Rafa.

-          “Eu não acredito que você tá perdida Sheila!”

-          “Pois é, estou!”

-          “Mas tá aonde?”

-          “Sei-lá to perdida ué!”

-          “Pede pra te mostrarem onde fica a estação de metro e pega o trem de volta pra Bermondsey” 

Ah Bermondsey... nomezinho ruim de pronunciar esse! É o clássico não se lê como se escreve, afinal se pronuncia Be(r)monZI com aquele R suave dos Ingleses. Pronunciei errado, eles me olharam meio de lado, então lembrei do mapinha do metro (Bendito mapinha!). Mostrei o lugar no mapinha e eles sorriram dizendo:
 
- “Ahhh Be(r)monZi!!!”

E assim foi, entrei no Tube, peguei a linha preta e estudando o mapinha direitinho, entendi como trocar de linha e voltar pra casa. Não preciso dizer que nunca mais me perdi no Metro né?! E  só pra constar, usar o Tube é fácil, muito fácil mesmo!
 
 

Saturday 16 November 2013

Welcome to England

Aproveitei o tempo de vôo entre Paris e Londres pra rezar e pedir que Nossa Senhora passasse na frente, abrindo todos os caminhos nessa nova fase da minha vida. O canal da mancha parecia interminável e lembro claramente da emoção de avistar os primeiros pedacinhos de chão do território Inglês. Sei que soa bobagem para alguns, mas a alegria era tamanha que eu tinha a impressão de estar voltando pra casa depois de um longo tempo.

As lindas planícies verdes se abrindo aos meus pés, algumas casinhas perdidas, vilas, tudo parecia surreal e encantador, quase mágico. Quando as filas de casinhas iguais, grudadas umas nas outras surgiu no cenário eu não podia acreditar nos meus olhos. Eu ainda nem tinha pisado naquele pais e já estava profundamente apaixonada.

Quando chegamos no aeroporto o Andrew e a Sharon me deram um bilhetinho com seu endereço e telefones. Antes que eu entrasse na fila da imigração ambos me deram um abraço e me desejaram boa sorte.

            A fila para a imigração era enorme e na medida que avançava meu coração ia disparando.
Coloquei a melhor cara blasé possível pra disfarçar o nervosismo, afinal como tinha lido,  oficiais de imigração são como cães, sentem o medo de longe e, medo denota algum tipo de irregularidade. E eu não queria isso!
Estava vestindo uma roupa que comprei especialmente para a ocasião, calca jeans e um twin set azul clarinho. Nada exagerado, com cara de estudante mesmo, exatamente o que diziam nas comunidades do Orkut – “vá com cara de estudante, porque se for com cara de quem vai trabalhar, já era!”

Meu maior medo era o de falar demais , o que sempre acontece quando estou nervosa. E que no caso da imigração torna a coisa muito complicada. Quanto mais você fala, mais perguntas você levanta, então a dica era só responder exatamente o que te perguntam, nem mais, nem menos. Tentei pensar mais na vontade de ver a Inglaterra do que no medo de não vê-la.

Não sei quanto tempo demorou aquela fila, só sei que na velocidade que meu cérebro trabalhava eu podia  até ter escrito uma tese de mestrado sobre a imigração inglesa. Lembro de analisar os fiscais que estavam trabalhando naquele dia, tinha um loiro baixinho com cara de nazista, uma mulher gordinha com cara de cansada ou entediada, um indiano com uma espécie de turbante e um homem gordinho com cara de pai de família bonachão de filme Americano. Tentei adivinhar qual iria me entrevistar e rezei pra que fosse o gordinho de bochechas rosadas.

Olhei em volta pra ver se alguém tinha sido recusado, algumas pessoas pareciam tensas quando estavam sendo entrevistadas, outras nem tanto, mas nem sinal de ninguém sendo mandado de volta. Tentava ler os lábios dos fiscais pra ver se entendia quais eram as perguntas que eles estavam fazendo.

Na minha frente tinha uma mulher com duas crianças falando uma língua que eu não faço idéia de qual fosse. Mesmo que eu quisesse adivinhar estava tão tensa que tinha ficado até meio surda. Quando eles foram chamados pelo fiscal loiro com cara de nazista fiquei um pouco mais aliviada, porque não queria ser entrevistada por ele de jeito nenhum.
Mal acreditei quando o fiscal gordinho com cara de Americano me chamou e pro meu espanto ele sorriu e me deu bom dia. Na minha imaginação fiscais de imigração não davam bom dia e eram como oficiais do DOI-CODI, ou coisa parecida.

Ele me fez três perguntas curtas e rápidas:

-          O que você veio fazer na Inglaterra?

-          Posso ver a carta da escola?

-          Qual foi seu itinerário?

Quando falei: "Rio de Janeiro" ele sorriu novamente e me contou, ao mesmo tempo que carimbava meu passaporte, que passou a lua de mel no Rio. Me devolveu o passaporte carimbado com visto de seis meses, com direito a trabalhar e me disse as três palavrinhas que eu sonhava em ouvir:

-          “Welcome to England!”
 
Eu nem acreditava, afinal ele não me perguntou quem ia me sustentar, nem mesmo onde eu iria morar. A imigração Inglesa foi tudo o que eu não esperava!
E não preciso nem dizer que foi muito bom ver o Rafael me esperando do outro lado!

Monday 11 November 2013

Meu cavalo encilhado

Quando chegou minha vez, botei minha melhor cada de corajosa e encarei sozinha um ônibus até Curitiba e depois um voo até o Rio de Janeiro, onde pegaria meu voo para Paris e finalmente London.
Se despedir não foi a tarefa mais fácil, afinal iria sair do país, morar num lugar desconhecido, com hábitos diferentes e onde a língua oficial não é o Português. Mas o consolo era que em seis meses eu estaria de volta e se Deus me ajudasse, sem aquele sorriso triste dos últimos tempos.

Alguns amigos me diziam que gostariam de ter minha coragem , na verdade eu não tinha coragem, tinha medo, mais ainda.. pavor de ser infeliz. Estava indo pra Inglaterra pra fugir da infelicidade, a possibilidade e o sonho de ser feliz é a maior motivação que pode existir. Meu avô costumava dizer que na vida “Cavalo encilhado não passa duas vezes” e eu tinha certeza que Londres era o meu cavalo encilhado!

Até então eu estava tranquila, a ficha - de que eu estava deixando o país para ir morar em um lugar estranho – ainda não tinha caído. Sai de Pato Branco chorando, mas no voo entre Curitiba e Rio de Janeiro estava tranquila.

No avião para Paris sentei ao lado de um casal de Ingleses que pareciam simpáticos. Ambos de meia idade, com uma pele linda de dar inveja e um ar inteligente. Tentei ler o que estava escrito na pasta que carregavam e só consegui ver a palavra congresso. Quanto mais eles falavam entre eles, mais angustiada eu ficava. Grudei a cara na janelinha do avião, o dia no Rio de Janeiro estava lindo e ensolarado, o cenário emoldurado pela janelinha parecia um quadro.

Quando o avião começou a se mover senti que o nozinho na garganta começou a apertar, enquanto isso os Ingleses do meu lado não paravam de falar. O sotaque tão difícil e eu não tinha a menor ideia sobre oque eles estavam falando, parecia que faziam de propósito falar daquele jeito pra me irritar. Não eh assim que as pessoas falavam nas aulas de Inglês!

Minha cabeça foi a mil, e eu só conseguia pensar “Meu Deus o que é que eu estou fazendo?” e aqueles Ingleses falando só me deixavam ainda mais nervosa. “Como é que eu vou morar na Inglaterra se não consigo entender o que esse povo fala? Ahh”
Quando o avião decolou eu já nem ouvia mais o casal de Ingleses, meus pensamentos gritavam e a ficha caiu em dois segundos – “Meu Deus eu estou deixando o meu País!” – e o choro, que eu guardei para fazer o papel de durona e corajosa, veio a tona. E eu comecei a soluçar alto!

Foi então que descobri que o estereótipo dos Ingleses frios e antipáticos era só mais um estereótipo, tão falso quanto minha pose de corajosa. Eles foram extremamente simpáticos e fizeram de tudo pra me consolar, até pediram pra aeromoça me trazer uma agua ou um chá – “What do you prefer my dear?”
Pratiquei inglês a viagem inteira e sem perceber pratiquei também a entrevista para a imigração porque eles me fizeram milhões de perguntas. Durante a viagem comecei a mudar minha idéia sobre os Ingleses e sobre o sotaque deles, que fica mais bonito a medida que você escuta.

Quando chegamos a Paris, me convidaram para ficar com eles e tomar um chá, afinal estávamos no mesmo vôo para Londres. E essa foi a minha sorte, porque eu não fazia a menor idéia de pra que lado ir naquele aeroporto enorme.
Eu já tinha estudado o mapinha do aeroporto, afinal estava viajando sozinha e não podia me dar ao luxo de me perder, mas ao vivo o Charles de Gaulle é tão grande que você tem a impressão de que te deram o mapa errado.

No meio daquela imensidão e com meus anjos da guarda Ingleses, eu tinha me esquecido um pouco do fantasma da imigração e quando chegamos a Londres eu já tinha o endereço e telefones dos meus mais novos amigos Ingleses. Até hoje agradeço muito a Sharon e ao Andrew por essa ótima e duradoura primeira impressão sobre o povo Inglês.

 

Saturday 9 November 2013

Eu vou para Londres

A idéia de morar na Inglaterra nunca tinha me ocorrido. Imaginava Londres como um lugar sinistro, escuro e frio. Tinha em mente os piores estereótipos possíveis – aliás ao me tornar uma imigrante descobri que nem sempre estereótipos correspondem a realidade – imaginava os Ingleses mal humorados, feios e nada amistosos.

A Inglaterra não era nem de longe minha primeira escolha, no passado tinha sonhado em morar na França, Itália, ou quem sabe estudar na Espanha, mas nunca o Reino Unido. Não escolhi Londres, foi Londres que me escolheu.
Só fui morar na Inglaterra porque meu irmão estava indo morar lá. A idéia de ambos, era voltar para o Brasil e fazer mestrado. Meu nível de inglês era ridículo e embora tivesse feito cursos, nunca tinha levado realmente a sério - lamentei isso muitas vezes em Londres.

O plano a princípio era viajarmos juntos, mas quanto mais líamos a respeito, principalmente em comunidades do Orkut e informações de alguns amigos que moravam ou já tinham morado lá, mais percebíamos que passarmos juntos pela imigração, não era uma boa idéia.
Naquela época para conseguir o visto de estudante– que podia ser tirado no aeroporto ao chegar – você precisava ter um responsável que provasse que poderia te sustentar durante seu tempo de permanência no país. E minha mãe claramente não poderia sustentar dois filhos estudando na Inglaterra.

Foi nessa época também, que eu comecei a entender o termo “Pra Inglês ver” O visto de estudante dava direito a trabalhar na Inglaterra, na teoria 20 horas semanais, na prática, bem mais. A prova de que minha mãe iria me sustentar era uma carta assinada por ela comprometendo-se a fazê-lo e o contra-cheque. Coisa pra Inglês ver mesmo! Então tivemos que apelar pro “jeitinho”, meu irmão foi primeiro e eu um mês e meio depois.

A imigração Inglesa era o terror de qualquer pessoa indo pra ficar. Pesquisei e estudei tanto a mesma, que virei quase uma especialista. Conferia todos os dias as comunidades do Orkut, tais como “Eu vou pra Londres” e “Brasileiros em Londres:”, copiando trechos e dicas e acabei montando uma apostila.

O mais engracado é que, ao mesmo tempo que essas comunidades ajudam, elas podem atrapalhar. Existe sempre aqueles sujeitos que gostam de aterrorizar os outros, fazendo drama, inventando e espalhando boatos. Até hoje não cheguei a conclusão se sao pessoas pessimistas, sátiros, sociopatas ou se foram pagos pelo governo pra apavorar as pessoas e fazer com que elas desistam, nunca se sabe! hehe. (Nessa época só queria mesmo eh que esse tipo de pessoa queimasse no inferno.)
Lembro de um cidadão que jah estava na Inglaterra e viva postando coisas como “Estão deportando geral” ou “Tá quase impossivel conseguir um emprego”. O jeito era ignorar, garimpar os melhores conselhos e estudar bem a imigração inglesa pra não correr o risco de bater e voltar.
 
Poucas vezes na vida rezei tanto, quanto na noite em que o Rafael embarcou para a Inglaterra, afinal, se ele não conseguisse entrar, as chances de eu conseguir seriam mínimas – isso se eu ainda tentasse.
Minha mãe e eu rezamos muito, tínhamos combinado com o Rafa que, seja qual fosse o resultado, ele nos avisaria na primeira oportunidade.


Quando o telefone tocou eu podia sentir meu coração batendo tão forte que tinha a impressão de que ele estava na minha garganta. Minha mãe atendeu e pude ouvir ele dizer: “Mãe, infelizmente…. vou ter que ficar seis meses morando em Londres!”
Foi um alivio tão grande! Agora tinha certeza de que iria mesmo morar na capital Inglesa.
Depois dessa notícia sonhava quase todas as noites com Londres. Comia Londres, respirava e falava Londres. Não existia mais nenhum assunto que me interessasse, até o coração partido já começava a doer menos.
Bem na época começou na Globo uma novela chamada América, que contava a história de Sol, uma carioca que sonhava em morar nos EUA. Essa tal de Sol teve o visto negado várias vezes e sofreu que nem uma condenada tentando atravessar a fronteira do México com a “ajuda” de coiotes. Eu não queria ir para os EUA, muito menos atravessar a fronteira ilegalmente, mas só de ver aquele drama todo com imigração me deixava muito ansiosa!

O mês entre a partida do Rafa para a Inglaterra e a minha viagem foi marcado por muita expectativa e ansiedade no grau máximo. E parecia que o universo estava fazendo de propósito, tudo era Londres! Na TV, nas revistas, parecia que de uma hora para outra o mundo todo resolveu falar de Londres.
Qualquer notícia que vinha de lá me deixava doida. E infelizmente não eram as melhores, o Rafa aprendeu a duras penas que Maio não era um bom mês para conseguir emprego e estava sendo bem difícil pra ele. Mesmo com um pouco de medo, chegou a minha hora de arrumar as malas!
 

Thursday 7 November 2013

Mais uma história de Imigração

Embora ame o Brasil, nunca me senti totalmente brasileira. Como a história de imigração da minha família é um fato relativamente recente, sempre me senti meio italiana.
Quando se é do Sul e de uma cidade pequena colonizada basicamente por imigrantes, ou filhos de imigrantes, você não se vê retratado nos meios de comunicação nacional e o que lhe é mostrado como “cultura brasileira” parece pouco com sua realidade.
É como se pertencêssemos a um país a parte, talvez por não se encaixar exatamente no que foi definido como “cultura brasileira”, talvez um isolamento voluntário ou ainda por um ressentimento do resto do país devido a Revolução Farroupilha. Quem sabe?

Com exceção da família de meu avô materno, que são descendentes de Alemães e Portugueses, o restante dos meus bisavós e tataravós são italianos. As famílias tanto de minha avó materna quanto de minha vó paterna, tem histórias bem similares. Agricultores do norte da Itália, não proprietários de terras, que devido a pobreza e fome na Itália, não tiveram outra opção senão enfrentar os “Trenta giorni di macchina a vapore” para ter uma vida melhor na América.

Talvez pela vinda  não escolhida e desejada acabaram conservando tão bem sua cultura. Já a história da família do meu Avô Paterno é uma mistura de lenda e realidade.

O sobrenome, que acredita-se ser de origem grega, já dá um tom diferente a história. Segundo a lenda da família, conta-se que somente um Ioris veio da Itália para o Brasil. Ele teria ido ao Brasil mais pelo gosto da aventura do que pela própria necessidade. Era um sujeito atlético e conseguiu trabalho no navio, possivelmente como estivador. Provavelmente só uma lenda de família.

Família Ioris - Jores
A hipótese mais provável é de que a história tenha sido exatamente igual a muitas outras, o que não desmerece o fato em nada, mas adoramos essa outra versão  fantasiosa.

De acordo com um recenseamento realizado entre 1880 e 1884, que consta no livro "História de Caxias do Sul", página 317, a família "Jores" chegou ao Brasil no ano de 1877. O Domenico mencionado no documento é provavelmente meu Tataravô.

Sunday 3 November 2013

O próximo capítulo


Toda história de imigração existe porque existe um agente motivador. Esse agente motivador pode ser o dinheiro a fome, um emprego, o desejo de aventura..etc... existe uma infinidade deles. No meu caso foi o amor, ou melhor, a falta dele.

Foi depois de levar o pé na bunda mais dolorido de minha vida. E tempos depois, o empurrão que faltava - a perca do emprego.

Ir embora foi uma tentativa de fugir de alguém, mais especificamente de um sentimento. Uma grande e profunda tristeza, alguém e um fato que deixaram marcas tão profundas que sei, nunca irão se apagar. O tipo de coisa que, quando você olha pra trás, vê aquilo BEM GRANDE escrito com caixa alta na história da sua vida.

Foi também uma tentativa de fugir da angustiante necessidade de crescer, virar um adulto. E que lugar melhor do que Londres - cenário do Peter Pan?!
Estava fugindo para uma espécie de Terra do Nunca, um lugar para onde as crianças vão quando são obrigadas a crescer, um lugar seguro, longe das mentiras do mundo adulto. Onde não se sentiria tristeza e onde não teriam corações partidos, já que é a terra das emoções e eterna alegria. Costumo dizer que os meus 6 meses em Londres foram meus últimos meses de adolescência. É claro que não vejo nessa minha NECESSIDADE de ir embora só uma fuga, vejo também a aventura e o desejo do novo.

Foi assim que em Junho de 2005,  juntei os caquinhos do que costumava ser meu coração e enfiei tudo em uma mala e fui morar na Inglaterra.

Sempre tive o sonho de viajar, quando era criança o desenho “Volta ao mundo em 80 dias” me fazia suspirar e imaginar que um dia seria eu naquele balão. Adorava qualquer tipo de viagem, mesmo as curtinhas como ir no mercado ou longas com ir pra praia nas férias. Era a primeira a entrar no carro pra ir onde quer que fosse, tanto que meu avô me deu o apelido de “zé gabina” (Cabine de caminhão sabe?!).

Depois na adolescência veio a vontade de colocar uma mochila nas costas e explorar o mundo, mas os anos passam, o mundo começa a cobrar mais responsabilidade, terminar a escola, ir para a faculdade e depois, pra ajudar, veio o tal grande amor. Nesse ponto eu achava que a idéia de viajar por ai iria ficar só no sonho mesmo.

Pra ser bem honesta, nunca sonhei em morar na Inglaterra, da qual a única impressão que tinha até então, era o estereótipo clássico de um lugar escuro coberto em neblina. Tinha planejado morar na França, Itália e Espanha, mas a Inglaterra não estava na lista, mas vontade de viajar nunca me faltou.

Não posso negar que, além de tudo, o gosto da aventura e esse sangue de imigrantes nas veias não tenha ajudado bastante. Sou descendente de colonos italianos, que fugindo da guerra, fome e miséria do norte da Itália embarcaram em um navio e desembarcaram em terras brasileiras.

Uma história da qual me orgulho plenamente e os admiro pela coragem, afinal pouco se sabia sobre o Brasil e o que esperar quando chegar. Embora os mesmos não tivesse muitas outras opções, a decisão de cruzar o oceano rumo ao desconhecido necessita de muita coragem - ou muito desespero!

Glamurosa ou não, essa é a História dos meus bisavós e por consequência a minha. História essa que, até então, parecia coisa de novela, algo tão distante quanto a própria Itália, isso até que eu mesma me tornei uma imigrante e senti na pele o que essa palavra significa.

Quando olho para a história da minha família é fácil notar que a imigração me acompanha desde sempre.  De acordo com fortes indícios, meu sobrenome – Ioris - é grego, possivelmente uma variação de Lioris.
Ou seja, somos gregos que imigraram para a Itália e que depois imigraram para o Brasil e que foram para a Inglaterra, ou sabe-se lá aonde mais.
 
Deve existir algum "gene imigratório" circulando em nosso sangue meio cigano, que nos instiga a imigrar a cada não sei quantas gerações.
(Foto - Família Ioris, 1931) 

Meus motivos para imigrar não foram assim tão grandiosos, meu coração estava em pedacinhos e eu precisava colá-los de qualquer jeito e mudar minha vida.
Na verdade, minha ida para a Inglaterra ainda não contava em minha mente como imigração, afinal eu tinha um visto de estudante de seis meses e esperava que esse tempo pudesse ser suficiente para curar o coração machucado e me sentir viva outra vez. Assim, poderia voltar pra casa após esses meses, renovada e pronta pra outra.

Pode parecer estranho, mas sempre olho para minha vida como se ela fosse um livro, onde é preciso adicionar capítulos interessantes, para que ele se torne agradável e interessante para o leitor. E então, quando um capítulo longo e intenso acabou, eu tinha que escrever outro...

 

FIM

Como muitas outras histórias, a minha começa pelo fim. Não pelo fim da minha vida, o que espero ainda estar longe, mas pelo fim de um relacionamento que abriu portas para um novo começo.
Quando uma história termina, leva um pouco de você com ela e você sente que nunca mais poderá ser aquela pessoa. Você sente a necessidade de criar uma nova versão de si mesmo, porque você não consegue mais encontrar o caminho para voltar a ser a pessoa que era antes.
Um final muda tudo,  mas também marca o início de um novo começo. E é este mesmo fim que te da forças para este novo começo.

A minha história é como de muitas outras, a da mocinha que tem o coração quebrado em mil pedacinhos e que vai pra longe tentar colar os caquinhos. E consegue!
Não é irônico que o fim de um amor acaba justamente abrindo portas para que sua vida se transforme e que um outro amor surja?

Mas essa viagem não serve somente pra colar os caquinhos, essa viagem é um aprendizado que transforma a vida da mocinha pra sempre. Por isso agradeço o fim, o novo começo e as pessoas que me ajudaram a recomeçar.